sábado, 21 de novembro de 2009

A palavra certa

Eu queria descobrir onde ela se esconde. Ah, como eu gostaria que ela estivesse estampada nas páginas amarelas, com endereço, telefone e e-mail, por mais que isso pareça absurdo diante dela, afinal ela deve ser divina. No principio era o Verbo...

Existem milhares delas, e precisamos delas pra tudo. Para expressar os sentimentos, para colocarmos em linhas e entrelinhas, para gritar ao mundo o que está transparente, até pra descobrirmos qual é o caminho e como chegar nele. Mas parece que existe uma, somente uma, que está entre nós e nunca encontramos.

Ela deve estar escondida em algum pergaminho no mar morto. Ela deve ser como um de nós entre bilhões de seres nesse universo. Como eu, você ou qualquer um de nós no meio de uma multidão, apenas um entre muitos, despercebido. Porém, todos existimos com uma força imensa nos guiando por essa vida louca. Ela é como um grão em quilômetros imensuráveis de terra neste planeta. Ou como uma gota, apenas uma gota em tantos mares, rios, águas. Tão pequena, e tão necessária.

E eu queria encontrá-la agora. Eu preciso encontrá-la. Porque somente com ela eu poderia expressar isso e fazer com que seja compreendido. Onde ela está quando precisamos fazer com que alguém entenda o que sentimos?

Talvez ela seja secreta, conhecida apenas por alguma sociedade que a guarda como aquele tesouro perdido que se tornou lenda. Ou talvez ela tenha afundado com Atlântida. Talvez, talvez, eu não sei. Talvez o “talvez” a conheça. Provavelmente se eu perguntar ao Talvez, só vou encontrar mais dúvidas, porque as palavras podem ser enigmáticas. Pistas? Aonde? Este mundo é tão imenso, assim como as páginas do dicionário. Eu admito, já procurei na Bíblia e desculpem os cristãos, mas não encontrei. Já procurei na natureza, no Sol, na Lua, e procurei os deuses de todos os panteões para encontrar alguma pista e nada. Já pensei que o Nada fosse a tal e então me perguntei, porque o Nada e não o Sempre? Já pensei até que ela estaria oculta no silêncio, mas porque ela não estaria ressoando dissonante em tão belas melodias já criadas?

Eu queria saber se eu sou a única que acha tão incompreensível ser mulher. Por mais que os homens tentem compreender, eles nunca compreendem totalmente. E é por isso que eu queria encontrá-la. Porque ela deve traduzir o que dizemos. Ela deve traduzir pra cada pessoa, de acordo com as idéias, valores, quem sabe línguas. Ela seria como um decodificador entre nós, e ninguém no mundo se sentiria incompreendido.

Por que é tão difícil ser mulher? Todos nós sofremos, e homens, mulheres, crianças, velhos e até animais sentimos dor. Todos sentimos aquele aperto dentro do peito como se o coração estivesse sufocando. Mas as mulheres sentem no coração e no útero. Por isso só elas se compreender, e também sabem como ajudar e destruir umas as outras.

Carregar algo no coração pode ser fardo ou dádiva enorme, mas carregar no útero é algo ainda maior. É o que nos conecta com o divino. E também é nosso ponto fraco, porque só quem sofre com o coração e com o útero sabe como é...

Não estou querendo menosprezar a tímida sensibilidade masculina. Tímida ou covarde, não sei, o fato é que raramente ela se mostra. Pelo menos de uma forma que nós possamos reconhecer. Não quero menosprezá-la, longe de mim, afinal tudo aqui se trata da única palavra tão procurada, mas é que acho que ela é a única coisa comum entre todos, e de repente eu senti esta vontade feminista ou feminina de escrever. Escrevi e escrevo. Girando e dançando em volta de tantas palavras, á procura de uma única.

Eu sei porque chamo algumas pessoas de irmãos e irmãs. É porque elas têm uma profundidade de existir. Como transcrever? Nessas horas é difícil encontrar palavras que expliquem. É porque essas pessoas também têm esses sentimentos, e vivem a procura dela. E elas aprenderam a entender a profundidade das palavras através dos sentimentos. Precisamos tanto entendê-los que nossa saída são as palavras, e então acabamos aprendendo o significado delas. E o quanto são intensas, profundas, algumas vezes afiadas, outras amáveis. Aprendemos também a reconhecer as pessoas que vivem intensamente as palavras, e isso não nos faz felizes, pois algumas vezes as coisas ao nosso redor parecem tão superficiais, é como se não fizessem parte do nosso mundo.

Nós nunca vivemos por viver. Embora algumas vezes pareça, porque eu sei que hoje quando olhamos pra trás sentimos que podíamos ter vivido de forma diferente pra ter algo maior agora. Mas olha só o que temos!!!É tão maravilhoso. Eu sei que houve momentos de aspereza, palavras ríspidas, lágrimas e dores. Mas não vieram á toa. Nunca vivemos por viver, sempre nos entregamos intensamente aos momentos, e é isso que nos torna tão parecidos. Sofremos, amamos, sorrimos e ainda fazemos isso a cada novo dia, mas não foi por levar a vida e ver aonde ela chegaria. Foi porque procurávamos a palavra certa. E mesmo sem encontrá-la, vivemos e sentimos essa profundidade de existir.

Eu queria que você ouvisse com o coração quando eu falo algo. Eu queria que acreditasse que não escrevo em vão, que não busco em sete notas uma melodia em vão, que não pergunto a mim, a você e ao mundo porque estou aqui e o que faço de melhor em vão. Eu tenho um motivo, uma busca, muitos sonhos e eu queria que alguém acreditasse em mim. Que alguém dissesse: Nossa!Parabéns por isso!Mesmo sabendo que sempre existe alguém no mundo que fará aquilo melhor que você. Mas, talvez aquilo seja o seu melhor até aquele momento, e você se esforçou pra chegar até ali e continua se esforçando pra ultrapassar aquele limite. Pelo menos eu estou me esforçando, me esforçando cada dia mais e até quando parece que estou deitada sonhando, ainda assim, continuo me esforçando.

Eu queria correr de braços abertos em um campo de girassóis. Um dia, viajando, eu vi um campo de girassóis, mas estava em um ônibus e não podia parar. Na verdade, nem parecia real. Parecia com alguma cena de filme, ou um daqueles sonhos que você jura que parecia real. Quem sabe, ela mora no meio dos girassóis e dance para o Leste a cada nascer do Sol. Nua. Como o sol, como Apolo, ela deve ser assim...De uma nudez mitológica. Beleza suprema, de inimaginável perfeição que brilha em luz tão intensa que cega, e é impossível reconhecer sua beleza. Tanta beleza pode até matar.

Deve ser preciso a imortalidade e eternidade para encontrá-la, mas eu precisaria que meu amor, meus irmãos, e as coisas lindas do mundo também fossem eternos porque senão não teria sentido a busca.

O que eu mais desejo nesse momento, é que essas palavras fossem vistas exatamente com as cores, formas e intensidade com a qual elas foram concebidas. Mas, a busca continua porque para traduzi-las, para traduzir o que eu e você tentamos dizer, para traduzir os ruídos e silêncios do mundo, eu preciso dela : a palavra certa.


By Lilian

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